Safra recorde de soja impulsiona economia no Norte Fluminense
Safra recorde de soja impulsiona economia no Norte Fluminense
TECNOLOGIA

No último mês, os municípios de Macaé e Campos ganharam destaque na mídia pelas safras expressivas de soja. Os estudos de viabilidade de cultivo, aliados à proximidade do Porto do Açu, transformaram a soja do Norte do estado em um produto de relevância econômica nacional.

A Primus Ipanema Agropecuária, de Macaé, exportou pela primeira vez, via Porto do Açu, 1.350 toneladas de soja plantadas na Fazenda Saudade. Em Campos, a última safra da Fazenda Santa Cruz registrou produção de 3 mil toneladas.

De acordo com o secretário de Agricultura do município, Almy Júnior, a última safra, finalizada em abril, somou aproximadamente 3 mil toneladas, com cerca de 850 hectares dedicados ao cultivo do grão. “Nossa região é terra plana, conhecida como Baixada do Rio de Janeiro, o que nos dá um enorme potencial para a soja. Ainda mais com a vantagem de estar a apenas 30 quilômetros do Porto do Açu. Aqui será uma das melhores regiões do país”, afirma. Segundo ele, a logística favorece a competitividade: “Você vende uma soja lá no Goiás a R$125, mas tem R$10 de frete. Aqui você vende a R$125 e paga apenas R$2 de frete”. Almy destaca ainda que a transição de culturas na Fazenda Santa Cruz, que antes se dedicava apenas à cana-de-açúcar e à criação de gado de corte, gerou empregos locais: “Só na parte de campo são cerca de 60 pessoas trabalhando. Desenvolve mais o lugar e cria mais emprego para as pessoas, diminuindo o desemprego.”

Segundo Arivaldo Viana, pesquisador da Pesagro-Rio, a história do cultivo de soja na região começou na década de 1980, no Centro Estadual de Pesquisa em Agroenergia e Aproveitamento de Resíduos, em Campos. Um estudo iniciado naquele período e retomado em 2017, com a participação de outro pesquisador da Pesagro, Benedito Fernandes, contou com a participação de pesquisadores e técnicos da Embrapa Agrobiologia, Embrapa Solos, Embrapa Agroindústria de Alimentos, Embrapa Soja, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Pesagro-Rio e Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O trabalho apontou que a região Norte, por suas condições de clima e solo, apresenta produtividade superior à média nacional. A pesquisa também avaliou fatores econômicos, de solo e infraestrutura regional. “Em reunião entre órgãos públicos e produtores, decidimos retomar os estudos sobre o cultivo de soja porque o cenário no Rio era outro. Havia o Porto do Açu, que poderia favorecer a exportação do grão, além da grande demanda interna por subprodutos da soja. Nosso trabalho confirmou o que Arivaldo Ribeiro Viana já havia evidenciado há 40 anos: o Norte e o Noroeste eram as melhores regiões para o cultivo da soja”, destaca Benedito Fernandes, agrônomo e pesquisador da Pesagro.

O Governo do Estado vê a expansão da produção de grãos com otimismo, estimando um aumento de aproximadamente R$ 7 bilhões no PIB do Rio de Janeiro, fortalecimento da atividade econômica local e geração de empregos e renda para o Norte e Noroeste Fluminense.

“Entre 1983 e 1991, já havíamos constatado a viabilidade da cultura da soja no Norte e Noroeste Fluminense. Com a retomada dos estudos em 2017, voltados para o mercado externo e com a participação do Sindicato Rural de Campos, Embrapa, pesquisadores, técnicos e produtores, ver essa grande vitória é motivo de muita satisfação para todos nós. Sempre devemos acreditar no nosso trabalho e investir em pesquisa e inovação tecnológica, pois isso traz desenvolvimento, especialmente para a população rural”, afirma Viana. Esta vocação para a produção de soja pode ser observada em Macaé neste mês. Foram necessárias 25 carretas para transportar a produção da Primus Ipanema, cuja colheita iniciou-se em fevereiro e se estendeu até abril.

Jonas Kluppel, gerente geral da Primus, contou que o plantio ocorreu entre outubro e dezembro do ano passado, em área de 380 hectares. “É a primeira vez que exportamos para a Rússia e pelo Porto do Açu. Antes, importávamos pelo Porto de Santos. Os investimentos em tecnologias de GPS, maquinários e insumos biológicos favorecem o crescimento da produção, que hoje gera 54 empregos diretos e 30 indiretos”, destaca Kluppel.

Desafios e estratégias dos produtores

O produtor Aluísio Gonçalves, da Fazenda Santa Cruz, conta que começou a cultivar soja em 2022, acreditando no potencial do estado para a produção de grãos. “Além da soja, planto milho e sorgo. Minha primeira safra, em 2023, foi a melhor, porque choveu bem no período. Já a segunda safra sofreu com veranico e só produziu 50% em relação ao primeiro ano. A terceira safra deste ano produziu 70% do esperado”, relatou. Aluísio também destacou a importância da estrutura para o sucesso da produção: “Minha estratégia é trabalhar com profissionais que entendem de grãos, ter máquinas de primeira linha, usar bons produtos e fazer as aplicações na hora certa - e rezar para chover”.

Soja 3

Apesar da vantagem logística proporcionada pelo Porto do Açu, ele apontou desafios: “A proximidade do porto reduziu o frete de R$ 18 para R$ 2 por saca. Mas ainda enfrentamos dificuldades, como a falta de representantes de máquinas agrícolas no estado e a ausência de silos adequados para armazenagem”.

Jonas Kluppel, gerente da Primus Ipanema Agropecuária, também compartilhou sua trajetória. O início do plantio ocorreu em 2016, em áreas experimentais de pequena extensão, em parceria com a Embrapa para identificar cultivares adaptadas ao ambiente local. “A estratégia adotada inclui a rotação de culturas entre milho e soja, o uso de esterco de confinamento para fertilização e o consórcio de milho com braquiária para formação de palhada e melhoria da estrutura do solo”, explicou. Segundo Jonas, a proximidade do Porto do Açu trouxe uma redução expressiva nos custos logísticos: “O envio da produção ao Porto de Santos gerava um custo de aproximadamente R$ 18 por saca. Para o Porto do Açu, esse custo caiu para cerca de R$ 3,80”. Entretanto, Jonas também mencionou os entraves para expansão da produção: “O maior desafio é o investimento elevado em maquinário, que no estado ainda não conta com estrutura de locação ou terceirização. Políticas públicas específicas para financiamento e apoio à mecanização seriam essenciais para fomentar ainda mais a produção”.

A história da soja em Campos: pesquisas e avanços

Soja 2

 

O pesquisador Arivaldo Viana relembra o início da introdução da soja no estado: “Em 1983, não havia um pé de soja plantado aqui. O Governo do Estado, por meio da Secretaria de Agricultura, criou um programa para ocupar áreas de reformas dos canaviais com soja. Foram oito anos de pesquisa até conseguirmos uma área comercial de 100 hectares, mostrando a viabilidade da cultura para a região”. Com o passar dos anos, a adaptação de cultivares específicas permitiu que o Norte e Noroeste Fluminense também entrassem no mapa da produção de soja. “Confirmamos o potencial da produção de soja na região Norte Fluminense e trabalhamos também para o Noroeste. A cultura mostrou produtividade acima da média nacional”, destacou Arivaldo. O pesquisador Benedito relatou a retomada dos esforços mais recentes: “Em 2017, o Sindicato Rural de Campos, preocupado com a decadência do setor sucroalcooleiro, promoveu uma reunião que reacendeu o interesse pela soja. Com apoio da Embrapa e de outras instituições, fizemos novos testes de cultivares. Apesar das dificuldades iniciais, a partir de 2020 e 2022 as primeiras áreas comerciais começaram a se consolidar, especialmente em Santa Helena e Macaé”. Benedito ainda enfatizou o impacto da evolução genética: “De 1983 a 2017 houve avanços significativos no melhoramento genético. As novas cultivares apresentaram boa adaptação e hoje o cenário é muito positivo para a soja em Campos e região”.

Zoneamento Agrícola facilita acesso a crédito e impulsiona cultivo

Os produtores fluminenses agora contam com um importante instrumento: o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) da soja. Com ele, podem acessar recursos do Plano Safra, além de outras linhas de crédito agrícola. Assinado em outubro e em vigor desde 1º de novembro de 2023, o Zarc foi fruto de um estudo envolvendo a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (SEDEICS), a Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SEAPA), o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), a Embrapa, a Emater-Rio, a Pesagro-Rio, prefeituras e produtores locais.

O Zoneamento Agrícola identifica os melhores períodos de plantio a partir da análise de fatores como tipo de solo e volume de chuva, minimizando riscos climáticos e garantindo maior produtividade. Desenvolvido pela Rede de Pesquisa Zarc da Embrapa - em parceria com o MAPA, Banco Central e Fundação Faped, o sistema existe desde 1996. “O Zarc é uma ferramenta essencial, tanto para os produtores quanto para financiadores. Sem ele, os bancos teriam grande receio de liberar crédito agrícola devido aos riscos. Com o Zarc, o risco é reduzido e o produtor acessa recursos públicos de forma mais facilitada”, explica Jerri Zili, pesquisador da Embrapa Agrobiologia.

Atualmente, o acesso ao Zarc pode ser feito pelo aplicativo Plantio Certo, disponível gratuitamente. Pelo app, o produtor escolhe o município e verifica, de forma detalhada, as condições ideais para o plantio.

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